.Nesse dia pressenti que a noite seria longa, estava cansada. Tirei os sapatos, os pés formigavam. Enchi uma bacia com água quente e mergulhei os pés nela e a mente deu um estalo, parecendo ir para outra dimensão, que alívio! De repente, a gata pulou na minha frente, quase me matando de susto e, sumiu, como sempre fazia, mas dessa vez ela mancava. Chamei-a para ver melhor, mas ela não miou. Bem, eu estava com fome, mas a disposição era zero, apenas coloquei a água para ferver na panela oficial do miojo (diz a embalagem que fica pronto em 3 minutos o tal do macarrão frito). Pensei em incrementá-lo e fazer um molho mais humano para acompanhá-lo, mas desisti em tempo instantâneo. Deitei-me no sofá para aguardar os 3 minutos eternos do miojo. A felina reapareceu e vi uma mancha vermelha em sua pata, o que me intrigou, estava machucada.
Levantei-me e a segui. Ela subiu as escadas correndo e sumiu. Entrei nos quartos e a procurei em todos os lugares “felíneos”: armário, gaveta, bolinho de roupa no chão, mas em vão. Vi manchas de sangue no corredor e meu coração resolveu pulsar na garganta. Segui-as até o terraço. Minhas pernas vacilavam. Tudo estava diferente, as plantas estavam tortas, como se o vento resolvesse esculpir os caules para um lado só, mas para o meu desespero, não eram só as plantas que estavam tortas, tudo estava. Pisquei os olhos, mas nada mudou. Abri a torneira, achei que molhar o rosto consertaria as coisas, “só que não”, a água não corria nas minhas mãos, mas era jorrada torta também. Desci as escadas correndo, quando me deparei com a gata, também torta! Com o susto, pisei em falso e caí da escada.
Não sei quanto tempo fiquei no chão. Lembrei-me da água do miojo e fui à cozinha. A água ainda não tinha fervido. Ótimo! Foi um pesadelo em tempo instantâneo do miojo! Ainda assim, para garantir a realidade, resolvi vigiar a água até ferver. Eu não sentia mais fome, mas parecia o mais sensato a fazer. Precisava daquela normalidade: fazer um miojo! Esperei alguns minutos. Esperei algumas horas. Amanheceu. A água não ferveu…
OBS
Tenho um carinho muito especial por esse conto por vários motivos:
1– Foi meu primeiro conto, tive a intenção de espantar a pandemia por uns momentos;
2 – A ilustração é do filhote! Oowwnn!
3 – Escrevi em uma noite fria de sexta-feira, entre 2 ou 3 goles de uma taça de vinho.
4 – Tinha lido com o filhote O Gato Preto, do Allan Poe, e me inspirei olhando para nossa gata Feijão.